domingo, 18 de outubro de 2015

RITUAIS MACABROS E UMA INFÂNCIA BANAL DE UM PREDADOR


(Edmar Oliveira)

Uma amiga minha jura que não come caranguejo pela forma cruel como os bichos são mortos. Estava tentando convencer a ela que existe método menos cruento de matar o bicho, para satisfazer o meu apetite por caranguejos, quando me veio a inspiração para essa crônica.

De certo, os matadores de caranguejos são cruéis. Uma afirmação culinária garante que eles só servem para a nossa apreciação se cozinhados vivos ou mortos imediatamente antes de despejados em água fervente! Mas nunca tinha me deixado impressionar, pois o meu desejo de bater neles, mesmo depois de mortos, pra apreciar sua minguada carne me fazia esquecer a crueldade, acho.

Minha amiga tocou num ponto sensível. Aí lembrei que tenho uma filha que herdou meu apetite pervertido para martelar mais do que comer a deliciosa iguaria. Ela tinha-me contado que aprendera com uma fazedora de caranguejos que se eles forem colocados no gelo adormecem como se anestesiados e não sentem a morte no cozimento. Não sei se a garantia de minha filha é apenas uma desculpa para continuarmos nosso ritual macabro sem culpa.

Mas eu tentava convencer minha amiga de outro ritual que fazemos para esquecermos que somos predadores. Atualmente os cortes de carne, frangos e peixes, expostos nos supermercados parecem que veem de uma fábrica asséptica de alimentos. Aquele ambiente é feito para evitar que imaginemos como os animais são mortos. (Tem um vídeo rolando na internet, que aconselho aos mais sensíveis de nunca verem para não se tornarem imediatamente vegetarianos).

Tenho a convicção que a culinária é desenvolvida e fica cada vez mais sofisticada para esquecermos o nosso passado de predadores comedores de carne. A primeira matança de bois que vi numa fazenda, em Palmeirais, jamais esqueci. Tinha menos de cinco anos. Mas assistia aos bois entrarem num corredor sem saída para a machada pesada e o sangramento final. Fiquei como hipnotizado vendo os bois mansamente irem ao matadouro sem nenhuma revolta, apesar de eu achar que eles estavam com os olhos tristes e sabiam o final que os aguardava.

Meu avô era um matador de bodes. E aprendi com ele o significado de “bom cabrito não berra”. A ovelha morre mansamente, o cabrito esperneia. Não mais que o porco. Esse grita, quase como falando e pedindo socorro. Os magarefes italianos imobilizavam porcos com choque elétrico e Cerletti, o inventor do eletrochoque na psiquiatria, se inspirou na matança de porcos. Não me perguntem a relação que ele viu entre porcos e doidos (esta historinha está no meu “von Meduna”).

Sei que o assunto está ficando pesado para os que não tiveram infância no campo. Isso era absolutamente normal e não conheço nenhum de nós traumatizados por essas historinhas que eram fatos banais e corriqueiros nas nossas vidas. Criávamos porcos, bodes, galinhas nos quintais. E elas nos alimentavam no dia a dia. Acho que apenas nos aprofundávamos mais na consciência de que somos predadores, o que hoje passa batido na educação na cidade.

Mas o mais inusitado ainda está por vir, se é que ainda tem alguém acompanhando este assunto que pode parecer macabro. Macabro pode ser pra vocês. Pra mim, apenas lembranças infantis de evocam saudades e afetos.

Minha avó matava porcos e galinhas para fazer o nosso almoço. Vi muito ela sangrar uma galinha e colher o sangue no vinagre para fazer um frango ao molho pardo, que até hoje adoro. Pois bem, uma vez a velha foi fundo demais e cortou – sem querer – o pescoço da galinha, tirando sua cabeça fora. A galinha saiu andando sem cabeça caindo mais à frente e eu e minha avó ríamos muito! Quanta mudança para esses tempos politicamente corretos de agora. Fácil, quando não somos nós que matamos os animais para a nossa necessária alimentação.

Depois eu conto a história da minha avó sangrando porco sem eletrochoque! Mas queria que os mais novos não esquecessem de que ainda somos um predador sobre a terra.



PS1 – O primeiro cara que inventou de comer um caranguejo, ou estava com uma fome sem tamanho, ou foi sacanagem de quem já tinha bebido.

PS1 – aos meus amigos vegetarianos: as plantas sofrem! Imagine uma alface cortada ainda viva no nosso prato. Não ouvimos os seus gritos porque ela é muda, mas sente quase tudo que grita um porco ou esperneia um caranguejo numa panela de água fervendo.








  


  


Apenas um sonho



(Geraldo Borges)

            Tive um sonho, mas não gostaria de contar. Sonho ás vezes é profecia; ainda bem que as profecias nem sempre acontecem. Mas, seguindo a linha do texto, já devo ter aguçado a curiosidade do leitor. Existe sonhos simbólicos  que precisam ser interpretados. O meu foi claro. Mas, de minha parte o considerei um pesadelo. Não vou resumir de uma pancada só o que eu vi dormindo. Sei também que os meus leitores não gostariam de sonhar o que sonhei. O diabo é que o cristão não escolhe os seus sonhos, e quando escolhem, geralmente viram pesadelos.

            Vamos a mais um parágrafo de meu sonho. Ainda não contei por que, se contar logo, a crônica acaba e eu acordo.

O que estava acontecendo? Engenheiros, arquitetos, mestre de obras, operários, restauravam a cidade. Recriavam casarões antigos, sobrados de varanda e janelas persianas, mais ou menos, dentro do perímetro que hoje poderíamos chamar de Cidade Velha, que sai do cais do Parnaíba e chegava até o Alto da Moderação e o Alto da Jurubeba.

De repente eu vi toda a Cidade Velha, de ruas antigas, como qualquer habitante do tempo passado poderia ver a capital com seus monumentos de origem, os quais, garantiam  autenticidade a cidade verde.. No sonho tudo voltava  ao normal, a origem. Os habitantes da cidade estavam contentes. Vinham turistas de toda parte para ver a cidade velha, caminhar nas ruas sem asfalto, ver os acendedores  de lampiões das ruas, curtir a província rediviva.que ante estava submersa. Ver os barcos  a vapor ancorado no cais, visitar os cabarés da Paissandu, sentar a boca da noite em cadeiras nas calçadas, e ficar conversando até soprar a brisa marinha di litoral.A cidade não estava  como no livro de Paulo Tabatinga, completamente deformada e monstruosa... Sitiada.



            Todo sonho termina de repente, como um filme que quebra a fita, e o melhor ou pior acontece. Engenheiros e arquitetos e outras autoridades resolveram  num lance de vaidade adornar a cidade com um monumental Arco do Triunfo.E tomaram a liberdade, ali mesmo, na Praça de Liberdade, de fazerem um projeto, que teria como foco derrubar a Igreja São Benedito, esta foi a parte do sonho que considero um pesadelo. Escutei os notáveis, o alcaide, os  conselheiros municipais, confabulando  tudo. A minha vontade era dizer não. Não. Isto é um sacrilégio. Mas a minha língua estava presa. Eu queria acordar, ficar livre do pesadelo. E como não podia dizer nada fiquei pensando: tudo pode acontecer. Mas, caso aconteça Frei Serafim de Catânia, o missionário católico  vai se revirar dentro do tumulo, e São Benedito vai ficar pálido de espanto. Mesmo assim desculparão a desfaçatez dos notáveis da cidade. E pedirão desculpas aos escravos e flagelados que construíram  com suor e lagrima esse monumento  da cultura  cristã, e que na entrada para a nave já tem o seu  arco triunfal.

            Acredite leitor que o sonho mexeu com a minha cabeça. Ao acordar de manhã cedo, a primeira coisa que fiz foi tomar um banho, beber café, E pegar um ônibus, até a Avenida  Frei Serafim. Fui ver a Igreja. Estava lá, imponente, com seu relógio e suas torres. As pessoas vinham chagando para a missa e entravam na igreja com o entusiasmo de sua fé, e, com certeza, jamais sonharia o sonho que eu sonhei.







NISE - o coração da loucura


(Edmar Oliveira)

Fui à pré-estreia de “Nise – o Coração da Loucura”. Foi uma noite emocionante. Ainda lá fora, o encontro com os colegas com quem trabalhei no velho Engenho de Dentro. Roberto Berliner veio me abraçar depois de tanto tempo. A ideia do filme começou a ser discutida quando eu ainda era diretor da instituição. Na sala cheia tive a sorte de abraçar alguns pacientes que participaram da película. Mais a emoção maior ficou por conta da arte do Berlinger.

Roberto pegou apenas um recorte da intensa vida da Psiquiatra Rebelde para mostrar a emoção de lidar da velha mestra. O filme começa quando Nise volta de longo exílio, após a prisão na ditadura de Vargas, para terminar na exposição dos artistas do Engenho de Dentro, promovida pelo crítico de arte Mário Pedrosa (Charles Fricks). Um curto período, mas onde condensou toda a emoção da velha guerreira para impor seus métodos à antiga e prepotente psiquiatria (pena que esteja voltando travestida de moderna neurociência). E ela teve que se socorrer da arte para romper o isolamento que a cercava.

Berlinger põe na boca de Nise (a excelente Glória Pires), com toda propriedade, uma frase de Antonin Artaud. Mostrando sua discordância com os cruentos métodos dos médicos, dirige-se a um deles: “Vocês só têm sobre eles a força” (Artaud falou “sobre nós”). E quando compara sua técnica (que os médicos procuravam ridicularizar a terapêutica ocupacional como se fosse uma “ocupação sem importância”) ela vocifera: “eu tenho os pincéis e vocês o furador de gelo” (”instrumento” usado na lobotomia). Frase que tanto poderia ser de Nise ou de Artaud. Uma guerra que ainda hoje continua entre os que defendem um “serviço substitutivo” contra os trogloditas que ainda nos dias de hoje defendem o manicômio, o choque elétrico (com o inútil suporte da anestesia) ou a lobotomia (com o disfarce da psicocirurgia).

O filme parece um documentário quando acompanha os artistas que seriam revelados pelo Mário Pedrosa: Fernando Diniz (Fabrício Boliveira), Emígio (Cláudio Jamborandy), Carlos Petuis (Júlio Adrião), Lúcio (Roney Villela), Otávio (Flávio Bauraqui), Raphael (Bernardo Marinho) e Adelina (Simone Mazzer). A composição que cada ator dá ao seu personagem é espetacular! Cada um deles é um documento riquíssimo. Imagino com é difícil compor personagens mortos, onde se acham apenas algumas pontas de filme antigo, e num deles (Lúcio) só um retrato três por quatro do prontuário.

Conheci três deles muito bem, apesar de já idosos. O Fernando do Boliveira é muito perto do Diniz que conheci. O acompanhei de perto quando lhe demos uma casa de verdade para morar (morou pouco tempo antes de falecer). O Lúcio eu conheci depois da lobotomia que o tornou uma ameba. Mas eu sabia muito das histórias dos rompantes agressivos do Lúcio e posso dizer para o Roney que, no filme, chorei porque conhecia o futuro do seu afetivo personagem depois da lobotomia. E a Adelina que eu conheci era a própria personagem que a Simone Mazzer criou. Disse a ela que nunca tinha ficado tão emocionado na criação de um personagem, quanto fiquei na Adelina que a grande atriz deu vida. Simplesmente um sopro como se a própria Adelina ressuscitasse. Maravilha! 
   
Nise de Máximo

Depois do filme um debate com o diretor e atores. Berlinger apresenta o colaborador Jairo, com quem convivi quando trabalhei no Engenho de Dentro. Jairo hoje é a representação dos clientes onde Nise buscou os laços afetivos (que a psiquiatria tradicional garante não existir nos esquizofrênicos). Jairo escapou do manicômio para frequentar um serviço substitutivo e lá foi trabalhada sua autonomia e autoestima, baseados nos ensinamentos da mestra. Jairo pede a palavra apenas para dizer que não poderia ficar para o debate, pois tinha que pegar sua namorada no trabalho e já estava atrasado. Foi aplaudido pela plateia e significou o refazer dos laços afetivos que a Nise buscava nos seus clientes (como ela achava que devíamos chamar os pacientes).

E Jairo representou também a importância do filme de Berlinger. O filme é muito necessário no momento em que assistimos os tradicionais doutores psiquiatras apresentados na tela invadirem a realidade ignorando os ensinamentos de Nise da Silveira.  


PS 1 - o autor do texto foi por quase dez anos diretor do Hospital de Engenho de Dentro.

PS 2 - o filme deve entrar em circuito nacional agora que o festival Rio acabou.   
      


salgado maranhão & ciro fernandes


Xilogravura de Ciro Fernandes

35)
Do barro que a palavra acendeu teu nome,
debuta esse veneno de cerejas. E os
animais da arca, e as feras da savana,

todos virão beber no cálice dessa aurora.
Todos, face à fé que virou osso; todos, 
face ao maquinário de desovar almas.
Nem pedra de cantaria, nem barco
naufragado, nem sangue em ponta de faca,
escreverão o rio de tua herança. Recruta
teus dias no sol sobre as algarobas, no
remoinho das rotas perdidas. O vento 
não tem raiz.


SALGADO MARANHÃO
(Do livro Avessos Avulsos)






Menino de rua por Dino Alves





Climério

DESVAIRADO AMOR

Te amo desvairadamente
Como um lobo uiva pra lua
Como um santo descrente
Que sonha uma virgem nua

Te amo de um amor insano e pateta
Te amo como um poeta

(Climério Ferreira)

"cozinha profissional é outra coisa" desenhada por Antônio Máximo:










CONTRA O GOLPE QUE SE PÕE EM MARCHA

(Edmar Oliveira)

Hannah Arendt por Máximo

Foi impressionante o que aconteceu no enterro do petista José Eduardo Dutra. Apareceram panfletos escritos “petista bom é petista morto” e um grupo de senhoras e senhores portavam cartazes contra Lula (“sua hora vai chegar”) e contra o PT (sintetizado no panfleto apócrifo). Um desrespeito à dor dos familiares e ao cerimonial que se deve prestar aos mortos.

Os denominados “petralhas”, revoltados com a atitude fascista dos senhores “coxinhas”, enxergaram neles o monstro do mal. Inclusive foi descrita uma católica devota (crucifixo no pescoço), senhora próxima da terceira idade, talvez mãe e avó, que segurava o cartaz raivoso de “Lula, sua hora tá chegando”. Certamente o pequeno grupo agressivo apresentava-se em evidente atitude fascista e desrespeitosa com o próximo.

Hannah Arendt veria naquele grupo pessoas banais que carregavam o mal sem nenhuma culpa. Já descaracterizaram os petistas, os bolivarianos (seja lá o que eles entendem por este adjetivo) e os esquerdistas em geral. Os vermelhos foram despojados de todos os atributos humanos para permitir que ódio seja dirigido ao diferente, não a um semelhante. Eles não fazem parte da humanidade, nem são brasileiros e não pertencem à espécie dos patriotas que vestem nas suas passeatas a camisa amarela da seleção brasileira contra a corrupção (não conseguem enxergar a corrupção da CBF na camisa amarela que vestem). E são capazes de atacar os que se vestem de vermelho por serem corruptos, petralhas, bolivarianos, comunistas: “vão pra Cuba” (vaiaram até uma bandeira da Catalunha confundida com a cubana numa passeata). Carregam o ódio nos seus protestos, mas são pessoas banais, nossos vizinhos, a velhinha do cachorrinho, o vovozinho e seus netinhos. São pessoas comuns, que quando botam a camisa amarela se travestem de odientos manifestantes contra os vermelhos. O fascismo estava adormecido dentro deles e foi despertado. Não são monstros, são banais.

Arendt apanhou do outro lado por tentar demonstrar que o fascismo é um mecanismo construído pelas instituições e não pelas pessoas que executam seus atos. As pessoas simplesmente foram excitadas para despejarem seu ódio ao outro (que não considera semelhante) e não houve qualquer mecanismo de contenção institucional deste comportamento.

A mídia construiu esta excitação. Foi ela que amaldiçoou os petralhas, os bolivarianos, os comunistas, a ditadura de Cuba, a ajuda dos governos petistas aos ditadores de Cuba, da Venezuela e da Africa. Foi ela que ajudou a divulgar a corrupção dos petistas e a perdoar a corrupção de não petistas. Quando Eduardo Cunha saiu como corrupto nas páginas de jornal do estrangeiro, a nossa mídia dava uma notinha para não atrapalhar as manchetes das atrocidades cometidas pelo governo. Devia lembrar de um passado recente, onde excitou o fascismo e depois foi censurada por ele. Por outro lado o governo vociferou quanto pode, mas não implementou uma necessária “lei dos meios” que regulamentasse esse desbaratado ódio que a mídia continua a plantar todos os dias. Esquentaram o adormecido ovo da serpente.

Um ministro da Justiça pode ser um pacato cidadão e não reagir quando um grupo de transeuntes grita “petralha”, “ladrão”. O cidadão pode, mas o ministro da Justiça não pode ser insultado. Insulta-se a nação. E não tomar atitude colabora para ajudar a romper o ovo da serpente.

Uma câmara de deputados federais não pode ser dirigida por um presidente que não pode sair do país para não ser preso, com evidência de ter recebido propinas e provas de contas no exterior negadas por ele numa CPI (quebra de decoro absurdo). Mas ele é mantido porque o mal maior é tirar a presidente do poder e ele é um aliado da oposição para o processo de impeachment, que ameaça o tempo todo a estabilidade da nação. Claro que este comportamento institucional excita a direita adormecida. E acordada a serpente da direita o fascismo se manifesta no comportamento dos cidadãos. A oposição devia lembrar recente passado, onde ajudou o fascismo e foi depois esmagada por ele.

Por outro lado o judiciário se apresenta culpando os neo-corruptos como os vilões do momento. Qualquer ato de corrupção que não sejam praticados por governistas são esquecidos e adiados na sua apreciação. Isso ajuda a criar um sentimento de que somos governados por ladrões e é preciso acabar com a “raça” dos petistas. Qualquer semelhança não é mera coincidência. E o judiciário devia lembrar também do passado recente onde foi amordaçado.
Somos todos Bolsonaro por Máximo

Os bolivarianos, os comunistas, os esquerdistas, nós que vamos pra Cuba somos companheiros de infortúnio da “raça” a ser combatida, mesmo que não sejamos iguais e até expressamos ao PT a nossa discordância pela esquerda. Quem não ver diferença entre o azul da bandeira cubana do amarelo da Catalunha, menos verá diferença entre os matizes do vermelho. O fascismo está na rua excitado pela mídia, pelo judiciário, pelo legislativo, pelas omissões do governo.

Arendt veria que erros foram cometidos pelos petistas e apontaria estes erros também na geração das atitudes fascistas. E seria acusada de perdoar as atitudes fascistas dos “coxinhas” e culpar os petistas pela corrupção, que não começou com eles.

Mas temos de aprender com ela que o ódio pode ser provocado por seres banais e não por monstros. E nos desarmarmos de uma política do ódio para combatermos o fascismo provocado pelas instituições com todas as nossas forças e ações políticas e não dar também ódio por troco. O PT precisa fazer uma autocrítica dos seus enormes erros. Os esquerdistas devem se juntar numa frente para enfrentarem as instituições de direita. Contra o golpe que se põe em marcha!

  

Papa Francisco por Gervásio




PENSAR QUE HÁ QUEM NÃO CONCORDE...
"Nenhuma família sem casa!
Nenhum camponês sem terra!
Nenhum trabalhador sem direitos!"
Papa Francisco

na TV portuguesa:

Um amigo me mandou um vídeo da TV portuguesa que é um primor! A apresentadora começara uma entrevista com um político de uma coligação de centro-direita sobre a situação do país. Aqui não vale discutir o matiz ideológico. De repente a moça interrompe o entrevistado para uma cobertura, ao vivo, da chegada a Portugal do técnico José Mourinho, que acabara de romper o seu contrato com o Chelsea da Inglaterra. O repórter corre, mas não consegue sequer vislumbrar a fisionomia do futebolista. Aí fornece a preciosa informação de que ele veio em avião particular. Corta. Volta para a entrevista com o político português. A reação dele é surpreendentes. Que inveja tive. Imagina se nossos políticos fizesse um protesto desses frente às câmeras, ao invés de serem submissos... Só mesmo vendo o vídeo:


domingo, 4 de outubro de 2015

MININO, SAI DO SOLO QUENTE!

(Edmar Oliveira)
desenho: Izânio

Outro dia, em pleno jornal Nacional, a linda moça do tempo sacaneou Teresina. Botou um filme, gravado num de nossos quintais da cidade velha, onde uma moça fritava um ovo esquentado a frigideira, com um pouco de óleo, no calor do meio-dia.

Nós mesmos nos sacaneávamos antes que algum aventureiro lançasse mão da ironia para criticar o sol escaldante de Teresina. Quando era jovem, me recomendavam não sentar ao meio dia na escadaria da Igreja São Benedito: podia sair com os ovos fritos. Um amigo contava que conhecia uma parreira no quintal de um árabe, que não dava uvas, dava passas que o árabe encaixotava e vendia na quitanda. Outro jurava que carne de sol, no interior, era só matar o boi ao meio dia: não tinha carne fresca, já estava tudo seca pra se vender como carne de sol. A gente ainda comia sardinha de lata com farinha e quem abria a lada dizia que o óleo ainda estava borbulhando. E já botei fogo em capim seco, ampliando o calor do sol com meus óculos de míope. Nada que um banho de rio não esfriasse a cabeça. E isso era entre nós, não era via internet – para todo Brasil como a moça do jornal Nacional.

Na internet teve até outra conterrânea que repetiu a tentativa de fritar o ovo, tentando provar que era armação. Podia tá correndo um vento ou não conseguiu daquela vez, mas “se a lenda é maior do que o fato, publique-se a lenda”. Não vou duvidar. Aprendi cedo que só tem um jeito honesto de dividir um pastel: um corta ao meio e o outro escolhe.

Fiquei foi matutando que tanto se fala do nosso calor, queixamos do nosso sol quente, mas não sabemos ainda usar esse calor para fazer energia.

Passei num fim de verão no interior da Andaluzia, na Espanha, e o calor tão intenso quanto na minha Teresina. Um mormaço de fim de tarde, uma terra árida sem serventia, uma falta de vento que não mexia um pé de pau, como dizemos no Piauí. Enquanto o suor molhava a camisa imaginei o meio do verão ainda mais quente e um inverno rigoroso, às vezes com neve. Pior que o torrão que conheço de nascença. Mas me espantei quando comecei a ver uma “plantação” de placas de energia solar a perder de vista. E foi crescendo de forma tão infinita quanto os canaviais do nordeste. Me disseram que investidores árabes produziam energia solar e vendiam ao governo. Para aproveitar aquelas terras que não têm valor pela aridez e falta de sustança para a agricultura.


Taí uma ideia que podia vingar no sertão do Piauí. Tanta terra sem serventia podia produzir energia. Já pensou se a gente ficasse independente e sobrasse energia pra vender? Aí a gente podia fritar ovo no sol quente, com orgulho de quem sabe aproveitar o nosso calor...

Tô só pensando com meus botões, mas acho se a ideia deu certo por lá, podia vingar por aqui para que essa crônica não fosse um delírio de quem pegou “muito solo quente na muleira, quando era minino”!




  

Deu no Jornal Nacional: ovo frito no sol quente em Teresina



A propriedade de imagens do Globo me obrigou a tirar o vídeo, mesmo explicitamente dizendo que "deu no JN". Substitui pelas imagens do Jornal com a Ana Paula Padrão mostrando o vídeo (será que vão tirar?) e a sensacional charge de Izânio já feita há muito tempo.

JANGO - o tabu da ditadura

(Edmar Oliveira)

Conheço vários trabalhos do jornalista Chico Castro. Mas esse tem especial sabor. O meu exemplar com a dedicatória “para o amigo Edmar Oliveira, que neste mesmo bar viu os originais deste livro, com os comprimentos de Chico” é testemunha. Acompanhei parte do trabalho de pesquisa de jornalista que fuça arquivos e descobre pérolas que fogem ao historiador da academia.

Toda vez que Chico vinha ao Rio, tomávamos uma cerveja no fim da tarde e ele me confidenciava sua peregrinação: o insuportável calor da Biblioteca Nacional, as dispendiosas microfilmagens da Fundação Getúlio Vargas, a dificuldade da pesquisa no Arquivo Nacional. Mas quando ele me mostrou os originais, citados no meu exemplar, o sorriso era de quem venceu uma difícil batalha, mas tinha nas mãos o troféu.

E ele já começa o seu livro desafiando os historiadores que separam uma ditadura envergonhada de outra escancarada. Segundo suas consultas nos jornais da época, ela já se fazia mais do que escancarada. O perfil que traça de Castelo Branco é de um aventureiro que não vai largar a mão da espada. É o que diz Amaral Peixoto da fala do General Mourão após o golpe: “Este que está aí (se referindo a Castelo Branco), vai querer ficar, e os senhores vão precisar de mim para tirá-lo”(pg. 261). Mostra que os mesmos que assinaram o AI5 já acompanhavam Castelo. Insinua que a traição aos civis já estava arquitetada.

Faz o acompanhamento dos civis ao golpe militar, a comemoração em Copacabana, onde Brigitte Bardot – hospedada no Copacabana Palace, em férias com um namorado marroquino – teria perguntado se a revolução no Brasil era assim comemorada (como um carnaval!).

Demonstra que o discurso da Central – sempre dito como desencadeador do golpe – não era radical. “Nos termos que foi apresentada” (a Reforma Agrária de Jango) “ela poderia ter sido assinada pelos militares golpistas” (pg. 228). Lembra que o discurso de Jango na Associação dos Sargentos e Suboficiais das Forças Armadas, no Automóvel Club – na véspera do golpe – foi muito mais radical, aventando a hipótese do presidente está sob o efeito da metanfetamina (que Jango usava com frequência para ficar mais alerta). Mas “não foram as reformas, nem a lei de remessa de lucros, nem o comício da Central, nem o motim dos marinheiros, nem a reunião no Automóvel Clube que derrubaram Jango”. Magalhães Pinto (lembram do Banco Nacional?) ficou contra “quando Jango suspendeu o redesconto do Banco do Brasil às instituições bancárias”. Levar a Consolidação das Leis do Trabalho ao campo através do Estatuto do Trabalhador Rural contrariou à elite rural. “Uma ampla frente civil e uma minoria militar preferiram a morte política súbita do presidente” (pg. 267). O Congresso deu o cargo vago antes do levante militar.

Chico vai esmiuçar e levantar a pulga de que “os militares fizeram a revolução sem terem um projeto político para o Brasil. O único objetivo era retirar Jango do poder. Acabaram por fazer o jogo das elites brasileiras: ser a maior beneficiária das desigualdades sociais”(pg. 265). Na verdade era o clamor das elites contra a melhora das classes desfavorecidas, que achavam contidas nas reformas prometidas, que levou os civis a quererem a saída de Jango. Os militares montaram o cavalo oferecido.

Com o faro do jornalista aguçado, Chico Castro vai pegar na imprensa de ontem o que ecoa hoje na mídia. Os jornais não mudaram de donos e servem aos mesmos patrões. Na pagina 111, Chico acha nos jornais a seguinte sinuca de bico oferecida a Jango: “se aderisse à política de não oferecer mais créditos a fundos especulativos, perderia o apoio de poderosos grupos financeiros; se atendesse às demandas populares, certamente aumentaria ainda mais os rombos das contas públicas”. Qualquer semelhança com a situação atual seria mera coincidência? E a constatação de que grupos de esquerda e de direita viviam às turras e provocações? “Quem não era fascista, era comunista; quem não era comunista, era fascista” (pg 151). Troque por “coxinha” e “petralha” e teremos a intolerância atual.

As elites retrógradas e os militares golpistas tinham por finalidade retirar o trabalhismo do cenário político brasileiro, pondo para debaixo do tapete as demandas populares, em favor dos privilégios nunca derrogados dos grupos que sempre deram sustentação à República” (pg. 169). Substitua “militares golpistas” por “parlamentares golpistas” e hoje vemos uma presidente entregando todo o poder para “grupos que sempre deram sustentação à República”. Uma presidente que não mais governa, ficando entre a renúncia e ao impeachment. Jango se repetindo como farsa.

O livro de Chico é muito interessante, apesar das inúmeras obras escritas sobre o período. Tem uma ótica nova, pela lente do jornalista que fuça a história. Até no aliciamento que a direita sabe fazer aos intelectuais ou como eles se prestam voluntariamente ao papel de defensores da elite. O IPES – Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (patrocinado pelos EEUU e dirigido por Golbery do Couto e Silva) – juntava os intelectuais para minar o governo Goulart, dentre eles Rachel de Queiróz, Manuel Bandeira, Augusto Frederico Schmidt, Nélida Piñon, Gilberto Freire, Alceu Amoroso Lima, Odylo Costa Filho, Jean Mazon (Canal 100, lembram?), Julio Mesquita (Estadão) Wilson Figueiredo (JB) (pg. 90). Com o tempo alguns foram apagando esse passado cinzento e outros trabalhando mais pela ditadura. Na farsa repetida na história de hoje temos Ferreira Goulart, Arnaldo Jabor, Nelson Mota, Fernando Gabeira, quatro cavaleiros do apocalipse – entre outros tantos – que já não terão tempo de apagar o passado que escolheram ao final da vida.

Por essas e por tantas outras razões é bom ler, nesse momento histórico, o livro de Chico Castro.

PS – acompanha um rico anexo com documentos e fotos de época.
_________________
JOÃO GOULART – o tabu da ditadura

Ed.Nova Aliança, Pi, 2014, 336 p.








A la carte


Aqui
no quintal desta casa
(antiga horta de minha mãe)
- entre mundo e pensamento -
percebo uma falsa perspectiva
na geometria
da flora

Mas as palavras continuam
resistindo à deformação
que o tempo
inventa

ou que dele
(pêndulo e sumo)
retira a única substância
que verdadeiramente
alimenta.

(NATHAN SOUSA, do livro Um Esboço de Nudez, ed Penalux, Guaratinguetá, 2014)

O autor foi o vencedor do Prêmio José de Alencar, da União Brasileira de Escritores, 2015 com seu romance inédito Nenhum Aceno Será Esquecido. O Piauí espera ansioso a publicação da obra premiada.




TÁ TUDO DOMINADO!

desenho: 1000TON


Edmar Oliveira

Impressionante o papel das organizações Goblo para incentivar a cizânia na cidade partida: com a mesma foto na capa de dois jornais, as manchetes são diferentes. No Globo, jornal mais lido pela zona sul, “após assaltos, reações violenta em Copacabana”. No Extra, o outro jornal das organizações dirigido aos suburbanos: “gangues da zona sul cercam ônibus na saída da praia”.


As imagens de vídeos divulgados na internet são assustadoras. Grupo de brutamontes, brancos e exibindo o preparo nas academias, entram em um ônibus, tiram um pequeno e esmirrado preto e o entrega para a fúria da malta que agride o menino violentamente. Ele consegue escapar e outros o golpeiam no meio da rua, acompanhado de gritos histéricos de “mete a porrada”. O autor das filmagens grita “hurru!”, torcendo pelos agressores covardes.


Noutro vídeo, um ônibus superlotado é cercado e os agressores quebram várias janelas para agredir aos passageiros, que sacam as janelas de emergência e tentam fugir pelo outro lado, entre os carros em plena Avenida Nossa Senhora de Copacabana. A polícia aparece para tentar mandar o ônibus deixar Copacabana e impedir o massacre, mas, claramente, protege os agressores como cidadãos que tem o direito da revolta. Afinal a praia foi invadida pelos pretos e pobres, que fizeram arrastão e assaltaram durante o domingo de sol. Estavam sendo agredidos os moradores do Jacaré, pouco importando se fossem os assaltantes ou não. Eram irmãos de cor e de miséria. Ali não era o seu lugar, pareciam dizer as ações dos policiais.


Coincidentemente, o Secretário de Segurança reclamava que o Ministério Público tinha impedido a ação “preventiva” da polícia, que consistia em parar os ônibus do subúrbio e retirar os que eram suspeitos de serem assaltantes. Ação “preventiva” baseada na cor e aparência, que bem fez a Defensora Pública Eufrásia das Virgens em decretar ilegal, porque é. Dona Eufrásia deu uma entrevista com muito medo dos ataques que tem recebido pelas redes sociais. As mesmas redes que convocaram esses modernos milicianos para a ação contra os ônibus 474, conhecidos como 4-7-crack, no avanço da criminalização da pobreza.


Na reportagem do Globo, repórteres fazem várias viagens no ônibus marcado para testemunhar musica alta, uso de drogas e assaltos pelo caminho: os assaltantes descem do ônibus, roubam e voltam ao mesmo ônibus. O motorista, morto de medo, obedece. A conclusão vai dar razão ao Secretário: é necessária a ação “preventiva”. Mais: a partir de novembro este será um dos ônibus que não mais entrarão na zona sul. Fim de linha na Cadelária.


Que tal se os policiais encarregados da ação “preventiva” tivessem uma ação efetiva viajando nos coletivos para impedir os atos ilegais? Não precisa, parece argumentar a autoridade, já os conhecemos e deveremos prendê-los antes da ação. Mas essa nova lei “minority report” não pode ser usada no estado de direito. A autoridade insiste que só violando o estado de direito pode dar segurança ao “cidadão de bem”, outra excrescência normativa que condena aos mais pobres a não ser cidadão.


Na zona sul o Globo parece dizer que o “cidadão de bem” está apenas se defendendo dos assaltantes. No subúrbio o Extra diz que tem gang na zona sul agredindo ônibus, o que parece ser uma ação de agente duplo para incentivar o confronto. Porque o incentivo a pogroms precipita ações fascistas. As organizações dos Marinhos estão passando de todos os limites da constituição de uma ordem democrática. A autoridade parece querer ver o circo pegar fogo para ser chamada a agir fora do estado de direito.


Dona Eufrásia vive ameaçada, repetindo o velho mantra que possibilita sair da barbárie para entrar numa democracia:  “Qualquer pessoa deve ter acesso ao lazer. A praia é o lazer desses jovens. Arrastão não é só caso de polícia. Tem a ver com falta de acesso à educação, ao esporte e ao lazer”.


Mas dona Eufrásia e eu vamos ficar falando sozinhos. Não há espaço na mídia onde essas opiniões possam sem discutidas. Tá tudo dominado!

  

Nonato por Gervásio

Nonato Oliveira - 50 anos de pintura, mais de quatro mil obras espalhadas por todo o mundo e cerca de 20 exposições fora do país. No Brasil só é conhecido no estado do Piauí, onde nasceu.







que horas ela volta?


Que horas ela volta? de Anna Muylaert é uma porrada na nossa formação brasileira, enganosamente cordial. A nossa relação de classe e com o racismo é cordial enquanto o “outro menor” souber o seu lugar. “Mantenha ela da porta da cozinha para o quintal” na fala da patroa para que a empregada mantenha a filha no seu lugar, já que ela estava misturando as coisas e confundido a “cordialidade” com a “libertinagem”, é o resumo do conturbado confronto de classes, interpretado fantasticamente por Regina Casé e Camila Márdila (empregada e sua filha) e a família burguesa paulista vivida por Michel Joelsas, Lourenço Mutarelli e Karine Teles, esta em perfeita performance como a burguesa compreensiva e revelada em toda sua crueldade.

O mais não se precisa dizer do filme. Os meus pares burgueses sempre viveram em casa em que morava uma empregada “tratada como membro da família”: a escravidão passada ante nossos olhos com um disfarce palatável. Discutindo o filme com alguns amigos de classe percebi que eles conseguiram enxergar os outros, nunca eles próprios. Pois eu sofri na pele algumas situações, apesar da minha consciência política avançada. Percebi que estamos presos nos grilhões dessa sociedade podre. Ouvi notícias de que o filme envergonhava brasileiros no exterior. É para envergonhar, de fato!

Mas como disse um amigo, revolucionário era se o filme fosse pirateado, como “Tropa de Elite”, e fosse visto nos lares das classes que fornecem as empregadas domésticas para a nossa hipócrita sociedade. Espero que os cineclubes de comunidades divulguem essa vulgar historieta, que nos dá um murro na boca do estômago e, talvez, façam as empregadas domésticas terem coragem de mergulharem na piscina dos patrões e quebrar o encanto da falsa relação cordial.


Vale ver!

(Edmar Oliveira)






o Papa por Máximo


Passageiros do século vinte


(Geraldo Borges)

           
Cheguei ao mundo em 1941 em plena Primeira Guerra Mundial. Eu tinha quatro anos, quando a guerra terminou, e, me lembro, como se fosse um sonho, que o pessoal lá de casa, juntamente, com os meus primos, simpatizante dos comunistas, comemoraram a vitoria dos Aliados. Soltaram foguetes, pintaram bandeira e saíram em passeata pelas ruas da cidade. Fiquei sabendo de muitas outras coisas que não consigo relembrar. E que depois recapturei em conversas com outras pessoas ou em leituras de livro e jornais.

 Com a democratização, depois da guerra, Dutra vai eleito  ( 1946 – 1951) Legalizam o partido comunista, que concorre às eleições para a Constituinte. Uma vizinha, lá de perto de casa, na rua Campos Sales, candidata-se pelo partido, ganha apenas um voto. A alegria foi rápida. O partido é cassado, e volta à ilegalidade.

Começada a década de 1950 Getulio volta ao Poder(1951- 1954), após o seu tempo na querência. Seus inimigos da UDN o empreitam no Palácio do Catete. Ele não tem para aonde escapar, e, por isso mesmo, dispara um tiro no peito.  E deixa uma Carta Testamento. Depois de alguns suspenses, o governo  entra na interinidade. Até as novas eleições.

 Nessa época eu era um passageiro de apenas treze anos viajando de segunda classe. Não entendia nada de nada de política, a não ser a domestica, entre meu pai, minha mãe, e meus irmãos e parentes. Eu apreciava mesmo era o cinema, filmes de caubói e seriados do Zorro, no cine Rex e no Theatro. A morte de Getulio  não me comoveu. Diziam que ele era o pai dos pobres. Eu não era pobre.

            Juscelino entrou na dança das eleições  e foi eleito(1956 -1961 ), e resolveu construir Brasília, provocando uma grande imigração, principalmente de nordestinos e funcionários federais da antiga capital do Brasil a custa de salários astronômicos. Correu muito dinheiro e deve ter havido muita corrupção. Corriam  os anos dourados, era a época das grande chanchadas, da comicidade de Oscarito.

 Apareceu para substituir Juscelino um cara chamado Jânio Quadro, (1961-1961) com um farto bigode e  casaco  à gola  Mao, e tendo como símbolo uma vassoura, para  limpar  a sujeira do nosso país. Parece que foi a primeira vez que votei. Votei nele. Seu discurso parecia sincero, mas, por trás, havia muito populismo e demagogia. Homenageou  Che Guevara com uma medalha, o que deixou os militares, com a mosca na orelha. Proibiu a luta de galos. Fez bilhetes para ministros dispensando a morosidade burocrática. De uma hora para a outra renunciou  mandando para  o alto milhões de votos que o povo lhe tinha agraciado. Doidice. Culpou as forças oculta. Foram apenas sete meses de governo.

            Seu vice era de outro partido. João Goulart (1961 – 1964). Estava na China, no momento da renuncia. Voltou e quase não assume a presidência. Tiveram  que admitir o sistema parlamentarista para  que ele tomasse posse. Já era o começo do golpe. As Forças Armadas já estavam de olho em João Gullart. Ele era, de certo modo, herdeiro de Getulio Vargas, fora seu ministro do trabalho, e amigos dos comunistas, um balaio de gatos. O tempo fechou. Muitos comícios aglomerando multidões. A luta de classe tomando vulto. Eu tinha 23 anos de viagem por esse mundo cão quando deu-se o  golpe de Estado  obrigando  políticos a se refugiarem  no exílio, ou a ficarem amontoados em prisões.

            A partir daí começamos  a  contar o tempo áspero da história do Brasil. Vinte e um ano de Ditadura. Os generais brilhavam nas paradas militares. Castello Branco morreu em um acidente aéreo. Disse que logo mais iria restaurar a democracia. Quimera. As traças comeram o meu titulo eleitoral. Apareceu Costa e Silva com o rosto escondido atrás de seus óculos escuros. Depois veio Médice, o AI 5. Geisel, Figueiredo; esse não entregou o poder ao Sarney, não oficialmente de acordo com a liturgia do poder. Pois não o esperou para lhe entregar a faixa de presidente. Saiu pelos fundos do Palácio. Figueiredo  queria mesmo era o Tancredo  que seria uma rima, mas não foi a solução. Todo esse parágrafo durou vinte e um anos.

            Depois do governo do Sarney ( 1985 -  1990)  vieram as eleições diretas. Votei no Lula, ganhou o Collor, que mão demorou muito tempo, foi impedido de governar (1990- 1992). Itamar tomou a direção do governo, (1992-1994) até chegar as próximas eleições. Lula entrou no páreo, ganhou  Cardoso. Governou oito anos. ( 1915 – 2003). Finalmente dei uma dentro. Lula ganhou; O século vinte tinha acabado. O  governo do PT começou mais ou menos. Do meio para o fim  meteu os pés pelas mãos, tentando agradar a  gregos e baianos. Esquecendo a sua origem operaria.


            Acho que, como passageiro do século vinte, extrapolei  os meus limites cronológicos.  E começo a ver coisas que não tenho coragem de dizer aqui. Mas, não é preciso mesmo dizer. A esta altura da minha viagem todo mundo está sabendo. E bem que me avisaram. Mas, eu não acreditei.






O Rio se ver no espelho:


Essas coisas de internet! Foto maravilhosa, sem indicação do fotógrafo. Coloco aqui na esperança que ele apareça. Gostaria de lhe dá os merecidos créditos